Abuso de medicamentos e lotação de UTIs na pandemia levaram a surto de fungo resistente, relata estudo

28 de novembro de 2022

André Julião | Agência FAPESP – Um grupo de pesquisadores brasileiros registrou o maior surto já causado por uma mesma cepa de Candida parapsilosis, fungo que invade a corrente sanguínea e pode levar à morte. O surgimento da linhagem, resistente ou tolerante a duas das principais classes de fármacos antifúngicos, ocorreu entre 2020 e 2021 em uma unidade de terapia intensiva (UTI) de Salvador, Bahia, durante um dos picos da pandemia de COVID-19.

O estudo foi publicado na revista Emerging Microbes and Infections e alerta para o possível surgimento de novas linhagens resistentes no futuro, bem como para a necessidade de práticas que ajudem a evitar infecções fúngicas nos hospitais.

“Nesse estudo, 90% dos pacientes infectados por essa espécie de Candida tinham cepas resistentes ou tolerantes a fármacos representantes das duas principais classes de medicamentos antifúngicos utilizados para tratamento de candidíase invasiva, o fluconazol e as equinocandinas. Dentre esses pacientes, quase 60% foram a óbito”, relata Arnaldo Colombo, professor da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (EPM-Unifesp) e coordenador do estudo, apoiado pela FAPESP.

Foram isoladas 60 amostras de Candida parapsilosis de 57 pacientes internados em UTI com COVID-19 grave. Análises genéticas mostraram que 51 (85%) dos isolados resistentes a fluconazol pertenciam a um mesmo cluster, ou seja, tinham o mesmo ancestral comum. Uma parte deles era ainda tolerante a equinocandinas, classe de medicamento usada contra isolados de Candida resistentes a fluconazol.

O termo resistência se refere à capacidade do microrganismo de se multiplicar mesmo na presença do medicamento administrado. Por sua vez, a tolerância ocorre quando o antimicrobiano atua reduzindo o crescimento do microrganismo, mas não consegue matar o patógeno.

“A circulação da cepa resistente, provavelmente, foi facilitada por meio de algum profissional de saúde, com a higienização precária das mãos, que acabou contaminando cateteres vasculares por onde são aplicados medicamentos e outras infusões diretamente na corrente sanguínea. Isso é resultado de uma UTI superlotada e muita demanda por atendimento”, explica João Nóbrega de Almeida Júnior, pesquisador do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FM-USP) apoiado pela FAPESP e coautor do estudo.

Almeida Júnior realizou parte do trabalho com bolsa de pesquisa no exterior, realizada no Center for Discovery and Innovation do Hackensack Meridian Health, nos Estados Unidos.

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