Apresentação de estudo que relaciona câncer e estilo de vida no Brasil foi o tema do último Seminário Científico
O Seminário Científico de Maio, realizado na última quarta-feira (dia 8), teve como tema a relação entre o estilo de vida do brasileiro e a carga do câncer no Brasil. Apresentada pelo pesquisador Leandro Rezende, do Departamento de Medicina Preventiva da FMUSP e do LIM 38 (Laboratório de Epidemiologia e Imunobiologia), a palestra “Epidemiologia: causas e preventabilidade do câncer no Brasil” trouxe números e estatísticas de quantos casos – da doença e de mortes decorrentes dela – poderiam ser evitados se cinco fatores de risco fossem combatidos: tabagismo, consumo de álcool, excesso de peso, alimentação não saudável e falta de atividade física.
Leandro fez uma breve apresentação da história sobre os estudos que relacionam atividade física e desenvolvimento de câncer. Nos anos 1920, surgiu uma primeira pesquisa que comparava o esforço físico durante o trabalho com o número de casos de câncer.
Nos anos 1980, surgiram mais pesquisas e dados sobre o tema. Nos anos 2000, tanto a Agência Internacional de Pesquisa em Câncer (IARC, na sigla em inglês), braço da Organização Mundial de Saúde (OMS), quanto a World Cancer Research Fund International, avaliaram que havia uma relação direta entre a falta de atividade física e o desenvolvimento de três tipos de câncer: mama, cólon e, possivelmente, endométrio.
Em seguida, o pesquisador apresentou sua metodologia: o cruzamento de dados oriundos de centenas de estudos feitos anteriormente (que relacionaram hábitos e câncer), com informações oferecidas sobre a população brasileira pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), pela Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) de 2013, e pela Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF).
Em um primeiro estudo, Leandro havia abordado apenas a relação com a atividade física. E concluiu que cerca de 2 mil novos casos seriam evitados por ano apenas com a recomendação básica da OMS de dedicar 150 minutos semanais em atividade física (algo como meia hora cinco vezes por semana). No segundo, ele ampliou para os demais fatores de risco citados no começo da matéria. E os resultados foram ainda mais impactantes: 114 mil novos casos (27% do total) e 63 mil mortes (34% do total) que seriam evitados por ano no Brasil se todos os fatores, combinados, fossem combatidos.
O estudo foi publicado na revista Cancer Epidemiology, em abril, e teve grande repercussão na mídia. “Como epidemiologista, me interessa mais entender os fatores sociais que levam ao aumento do número de casos em contraponto às causas individuais”, explicou o palestrante à plateia. “E mostrar a importância da prevenção primária, e não apenas aquela focada em exames preventivos, que é o que fazemos no Brasil, como no Outubro Rosa e no Novembro Azul”.
Debate
Ao final da apresentação, a plateia fez uma série de perguntas que foram desde os marcadores biológicos que fazem da atividade física um fator preventivo até a importância de leis e políticas públicas. “Com a retirada dos direitos dos trabalhadores e com as jornadas cada vez mais exaustivas, como é possível oferecer tempo e condições adequadas para que as pessoas pratiquem exercício físico?”, questionou Luiz D’Elia Zanella, médico infectologista que atende no ICESP (Instituto do Câncer do Estado de São Paulo).
Outras questões como a falta de parques nas grandes cidades, as taxações de produtos como o álcool e cigarro (o tabaco é o maior fator de risco ainda hoje) e a oferta cada vez mais massiva de produtos alimentícios ultraprocessados também foram debatidas.
Zanella, que é aluno de doutorado do LIM 60 (Laboratório de Imunologia Clínica e Alergia), participa com frequência dos Seminários Científicos dos LIMs. “São sempre interessantes, mas este, em particular, é muito importante para mim”, disse, ao final da apresentação. “Trabalho em um Pronto Socorro oncológico e lido com essas questões no dia a dia. Além de pesquisas como a dele ajudar a orientar nossos pacientes, é importante saber os dados relacionados a câncer do nosso país, tão marcado por discrepâncias e falta de políticas públicas que afetam diretamente a saúde dos cidadãos”.
De acordo com o professor José Eluf Neto, responsável pelo LIM 38 e orientador de Leandro no doutorado, a pesquisa apresentada é fundamental na construção de referências nacionais. “Sempre citamos os dados americanos, está na hora de usarmos os brasileiros”.
Os Seminários Científicos são organizados pela Comissão Científica e pela Diretoria Executiva dos Laboratórios de Investigação Médica (LIMs). São realizados sempre na segunda quarta-feira do mês e contam com palestrantes de áreas diversas da pesquisa científica dos LIMs.
Débora Rubin | Comunicação LIMs