De acordo com a pesquisadora do Laboratório de Hormônios e Genética Molecular (LIM 42) Luciani Renata de Carvalho, a deficiência de hormônio do crescimento é responsável pela baixa estatura enquanto a deficiência de gonadotrofinas é responsável pela infertilidade em pacientes com mutação no gene Prop1 em humanos
Peixes Paulistinhas (Zebrafish) com mutação no gene Prop1 que recuperaram o crescimento e a fertilidade espontaneamente podem contribuir para o desenvolvimento de novas abordagens terapêuticas para o nanismo hipofisário em seres humanos

Pesquisadora do Laboratório de Hormônios e Genética Molecular (LIM 42) Luciani Renata de Carvalho. Créditos: Laboratórios de Investigação Médica (LIMs).
Na última quarta–feira (09/10), os Laboratórios de Investigação Médica (LIMs) do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP) realizaram o seminário científico Hipopituitarismo Congênito: Suas Diferentes Apresentações entre as Espécies Homo sapiens, Mus musculus e Daniorerio, com Luciani Renata de Carvalho. Recentemente a pesquisadora do Laboratório de Hormônios e Genética Molecular (LIM 42) conversou com a Equipe de Jornalismo dos LIMs sobre como o zebrafish como modelo animal de pesquisa poderá contribuir para o desenvolvimento de novas abordagens terapêuticas para o nanismo hipofisário em humanos.
“A deficiência hormonal hipofisária é uma doença incomum, que ocorre em um a cada oito mil indivíduos. Os pacientes repõem Corticoide, Hormônio do crescimento, Levotiroxina, testosterona, quando são homens, e estrogênio e Progesterona, quando são mulheres. São muitos remédios. A partir da observação do hipopituitarismo em outros animais, concluímos que eles têm um mecanismo de recuperação, seja espontâneo como no zebrafish ou com reposição hormonal como no camundongo macho portador de mutação no gene Prop1. Talvez um dia possamos usar este conhecimento para promover o tratamento nos seres humanos. Talvez em cinco ou dez anos possamos mudar a abordagem terapêutica porque o grande problema é que os pacientes precisam repor todos os hormônios. Fico feliz em trabalhar com uma doença que é tão rara, com a possibilidade de um dia melhorar a qualidade de vida dos pacientes”, afirmou Carvalho, na ocasião.
De acordo com a coordenadora da Unidade Multiusuários de Zebrafish, geralmente os pacientes com Hipopituitarismo Congênito dão entrada no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP) na infância. Em decorrência da deficiência de Growth Hormone(GH) ou Hormônio do Crescimento, os pacientes possuem baixa estatura, concentração de gordura no abdômen e fronte olímpica e nariz em sela. Em decorrência da deficiência de Hormônio Estimulante da Tireóide (TSH), os pacientes possuem retardo da velocidade do crescimento. Em decorrência da deficiência de gonadotrofinas levando ao hipogonadismo hipogonadotrofico [hipogonadismo hipogonadotrófico é a deficiência das gonadotrofinas Hormônio Folículo Estimulante (FSH) e Hormônio Luteinizante (LH), que produzem os hormônios responsáveis pelos caracteres sexuais e pela reprodução], os pacientes possuem também puberdade tardia. Em decorrência da deficiência de Hormônio Antidiurético ou Vasopressina (ADH), os pacientes possuem diabetes insípidus.
Em compensação, a deficiência central de corticoide ou Insuficiência Adrenal Secundária [Insuficiência Adrenal Secundária é a deficiência de Hormônio Adrenocorticotrófico (ACTH), que produz o cortisol] em pacientes com Hipopituitarismo Congênito não é tão marcante como na insuficiência Adrenal Primária. Entretanto, os pacientes com Insuficiência Adrenal Secundária precisam repor hidrocortisona em condições basais. Em períodos de estresse, a dose do corticóide deve ser o dobro. Em decorrência da deficiência de Prolactina, as pacientes do sexo feminino não possuem lactação. Segundo a médica assistente na Disciplina de Endocrinologia, as pacientes do sexo feminino com hipogonadismo hipogonadotrófico são encaminhadas para o departamento de Reprodução Assistida porque elas não conseguem engravidar espontaneamente. De cinco pacientes do sexo feminino que se trataram no departamento de Reprodução Assistida, duas apresentaram níveis suficientes de Prolactina para amamentar os seus filhos até os dois anos de idade e três não apresentaram níveis suficientes de Prolactina.
“Nós sabemos que o Prop1 é importante para a produção de corticoides nos seres humanos,com evolução para insuficiência de cortisol em 50% dos pacientes. Nós sabemos que o Prop1 é importante para a diferenciação das gonadotrofinas, com evolução para Hipogonadismo e, consequentemente, para infertilidade. Nós sabemos também que há a linhagem Pit1 dependente, ou seja, o Prop1 ativa o Pit1,com evolução paradiferenciaçãodo TSH, GH, e Prolactina. Então se nós tivermos uma ausência da expressão do Prop1 e / ou do Pit1, os hormônios terminais estarão comprometidos”.
“Tudo isto nós aprendemos a partir de um modelo animal, que foi primeiramente descrito por Gowen e Schaible, em 1961. Este modelo animal foi descrito com ausência ou diminuição de GH, TSH e Prolactina, baixos níveis das gonadotrofinas e dismorfologiae hipoplasiada hipófise. Nós sabíamos que o problema de pesquisa estava descrito do ponto de vista clínico e laboratorial deste 1961. O professor Bartke fez o primeiro estudo em 1965, mas só em 1996 o grupo do professor Rosenfeld determinou o defeito genético em questão no camundongo”, delineou Carvalho, no seminário científico.
Durante o seminário científico Hipopituitarismo Congênito: Suas Diferentes Apresentações entre as Espécies Homo sapiens, Mus musculus e Daniorerio, Carvalho também apresentou estudos realizados pelo LIM 42 para o desenvolvimento de novas abordagens terapêuticas para o nanismo hipofisário. O projeto de pesquisa de mestrado da pesquisadora Bruna Viscardi Azevedo, Fertilidade Restaurada após Tratamento com GH e Levotiroxina em Modelo Animal de Hipopituitarismo por Mutação no Gene Prop1, consiste no tratamento hormonal combinado de GH e Levotiroxina em camundongos machos com Hipopituitarismo Congênito para restaurar a fertilidade dos modelos animais de déficit de crescimento, hipotireoidismo central e infertilidade. “Meu projeto terá uma grande relevância para se entender o porque que em alguns pacientes com essa doença após tratamento hormonal temos um restauro da fertilidade e poderá servir no futuro para que esse mecanismo de restauro seja aplicado também nos pacientes que hoje ainda precisam induzir a gravidez através da fertilização in vitro”, explicou Azevedo.
Já o projeto de pesquisa de graduação da pesquisadora Débora Bissegatto, Caracterização Fenotípica do Zebrafish (Danio rerio) Portador de Mutação no Gene Prop1 Gerado por Edição Genômica pela Técnica de CRISPR/Cas9, consiste na caracterização de uma linhagem de Zebrafish com mutação no gene prop1 criada por edição genética para o estudo do Hipopituitarismo Congênito “Notamos que nosso animal apresenta um quadro de deficiência hormonal e de crescimento no início do desenvolvimento, porém na vida adulta essas funções são normalizadas. Caracterizar os mecanismos pelos quais a normalidade é restaurada será importante para entender melhor o hipopituitarismo congênito e porque em alguns pacientes é possível observar o restauro da fertilidade, para que isso possa influenciar no tratamento de futuros pacientes”, explicou também Bissegatto.
“Nós não vamos parar por aqui. Nós sabemos que o camundongo com mutação no Prop1 recupera a fertilidade com tratamento, que o zebrafish com mutação no Prop1 recupera a fertilidades em tratamento. Então nós vamos nos voltar para o ser humano, buscando entender porque alguns pacientes recuperam a fertilidade de maneira espontânea. Nós conseguimos determinar o fenômeno, mas ainda não sabemos porque ocorreu o restauro.Uma das direções futuras de longo prazo será o desenvolvimento de células–tronco pluripotentes induzida sem pacientes com hipopituitarismo para fazer um RNA–Seq [RNA–Seq é um tipo de análise de transcriptoma (os transcriptomas são porções de DNA transcritas em RNA), que revela a presença e a quantidade de RNA em uma determinada amostra] e um miRNoma [micro–RNA] para entender melhor a causa da doença nos seres humanos”, finalizou Carvalho.
Marília Carrera| Comunicação LIMs